“O QUE É SER PORTUGUÊS?” - José António Ambrósio
–
Ser português é amar Portugal. Ora essa!! Claro que ao sintetismo do asserto
com ressonância agostiniana há que acrescentar algo. Desde logo, saber o que é
o amor, donde provém, como se manifesta, se identifica, se fundamenta, para
onde nos leva; ao mesmo tempo e ipso
facto fazer as mesmas diligências no que a Portugal tange. Amor é energia,
uma energia de absolutérrima perfeição, cósmica, que se manifesta em/no agir,
se identifica nas nossas mundividência e mundivivência, também nos nossos
rosto, compleição e linguagem corporal se o que nos observa for dotado de uma
olímpica perspicácia. Ortega Y Gasset disse,
O cristalino critério de análise, acção e prospecção é,
pois, o amor vigilante (por economia doravante sem aspas).
–
Ser português é amar Portugal. Ora essa!! (Como se intui as iniciais e
precedentes palavras são puramente retóricas…). E amar porquê? – Desde logo
porque nos amamos a nós mesmos. E amamo-nos a nós próprios porque nos temos na
mais alta estima e esse é um programa vital, incoercível, “fatal” (com aspas,
claro). O termo-nos na mais alta estima é um estado e um processo. Estado de/da
consciência; e processo, agónico, para não o perdermos. A incompletude e o
devir humanos têm-se como um pressuposto. As prescrições religiosas aí estão a atestá-lo
desde as mais remotíssimas eras e as mais díspares latitudes e longitudes – tal
como a ascese e a parénese em tempos bem posteriores. Lembro o nosso filósofo-poeta,
Camões: “torna-se o amador na coisa amada”. É uma questão centrada na pessoa,
na sua rectidão interior, e, para o percebermos tão cabalmente quanto possível,
é instante declarar que, como disse “o mais sábio de todos os homens”,
Sócrates, “ ser sábio é o conhecimento de si mesmo” – Sócrates, que, com impertérrito
estoicismo, aceitou a condenação à morte ante a lancinante impotência de
familiares, discípulos, amigos e circunstantes. A inseparabilidade da sua
própria comunidade – para a paz e a guerra, tudo absolutamente – é um dos mais
impressionantes legados do daimon (voz
interior) do que “trouxe a Filosofia do Céu à Terra”. Aliás, para tudo o que
acaba de ler-se impõe-se que diga o que segue – visceralmente. Quando, em 1961,
ponderadamente, meu Pai me perguntou: “José António, queres ir à guerra?”,
pronta e convictamente respondi-lhe: – “Quero”. A minha existência estava à disposição
da Pátria. Ocioso declarar que uma Nação inteira me acompanhou – e tão-só isso
me bastaria para deixar claro, eloquente, o meu Amor por/a Portugal. Dulce et decorum est pró Pátria mori. Quando
a verdadeira História um dia aparecer não haverá mais razão de cizânia
Sou eu, nada mais posso ser senão eu, mas, tal
como em Sócrates, há em nós, ademais, como dito fica, duas dimensões que se
avantajam e equivalem: a estrita dimensão pessoal e a gregária. Somos uma
radical unicidade, o nosso ponto de partida é o Cosmos, Deus, a Infinita
Inteligência do Universo, o sopro cósmico, CHI (s.f. f. pronuncie tchi), como
nos identifica o Feng Shui da muito
ancestral cultura china. Eu só sou eu se me souber e, para tal, tenho que me questionar,
procurar. Quem são/foram os meus pais (pai e/ou mãe)? Os seus familiares donde
procedem? Que é a terra que os viu nascer? Que valores (ou ausência, enviesamento
deles) lhes foram incutidos (religiosos, culturais, intelectuais, laborais, sociais,
afectivos, éticos, estéticos…)? Tenho a minha árvore genealógica só desde 1822,
porque as tropas imperialistas napoleónicas, na Guarda, só não destruíram a Sé
Catedral – que vandalizaram e saquearam – por lhes ser impossível. Outra fonte
diz-me que tenho antepassados cátaros. É meu dever, minha obrigação, acentuar a
dimensão religiosa. Religare, do
Latim, significa ligar, atar, unir A minha carta astral é clara: o meu mundo é
o da Historia, Filosofia, Arte, Literatura… Ou seja: o ângulo a partir do qual
me situo para contemplar e agir sobre a realidade é peculiar, idiossincrásico.
O conhecimento de si mesmo determina uma permanente dedicação a si próprio e…aos
outros, assim se chegando à Comunidade. Tal como a comunidade humana é
originariamente, digamos, dual (só homem e mulher procriam) também o ser humano
é inseparável de uma participação
Destarte
se chega à História como instrumento de conhecimento. Após os primeiros vagidos
balbucios e chilreios, as primeiras importantes perguntas. Uma regra que me
parece inexpugnável para, no seu âmbito, nos situarmos foi enunciada por J. Flach:
“As linhagens são as grandes criadoras de nacionalidades”. A nobreza
portucalense de Entre Douro e Minho separou-se da monarquia asturo-leonesa; e
em breve iria precisar do contributo dos que, na História, ficaram designados por
“cruzados”. O combate estava religiosamente fundamentado e urgia lutar contra a
moirama. Era uma luta crucial, pois o confronto era entre dois Credos. E não me
alongo em dualidades… O critério de entendimento do ser humano relativamente ao
Homem e à História é o da alteridade (pormo-nos na pele do outro, digamos
assim), alteridade com as suas inerentes, indizíveis, humildade e persistência
– ao nível de “quem não deve não teme” – e nos antípodas da aberrante violência
da projecção. E a Monarquia portuguesa surgiu breve. Reconhecida a sua independência
(Manifestis probatum est…) perante as
outras realidades políticas peninsulares e da Cristandade pela Santa Sé
(vivia-se na respublica christsana), o
novel reino prossegue as directrizes de trás vindas: propagação da fé, expansão
territorial e o mar como via para o mais além. Já no reinado de “ O
Conquistador” embarcações portuguesas iam a França, Flandres e ilhas britânicas,
acentue-se. A luta contra os sarracenos continuou até
…Sobre
o cativeiro oliventino imperativo é dizer algo. Em 12-IX-1997, nas cerimónias
comemorativas dos setecentos anos do Tratado de Alcanizes,
Enquanto
professor convidado na Academia Sénior da minha cidade, onde leccionei História
da Arte, organizei uma viagem de estudo à vila alentejana. Foram, talvez, 50
pessoas. O nosso cicerone em Olivença foi Joaquín Fuentes Becerra. (Por
imposição de Franco, a fim de apagar o portuguesismo, os nomes lusos tiveram
que ser substituídos por espanhóis). Pela acrisolada afectuosidade do Joaquín –
ao mesmo tempo que pela sua qualidade profissional – e, outrossim, porque, da
comitiva, excepto eu, ninguém, salvo erro, já tinha ido a Olivença, o resultado
da viagem foi um êxito. Com efeito, dos alunos, um ou outro ignoravam a questão
– mas houve manifestações de verdadeiramente espantada emoção quando se lhes
deparou a catedral de Santa Maria Madalena, a Torre de D. Dinis, a igreja de Santa
Maria construída no tempo de Filipe I, as edificações de Carvalho e Melo
(Pombal)… Como supra dito, o amor a Portugal afirma-se
José
António Ambrósio
Obra
submetida a concurso
"O Que É Ser Português?"
ENSAIO
Edição 2021
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